Quem tem medo do Amor Livre?

Tempo de leitura: 5 minutos

Por Gyan Pavita

Pra começar, sempre desconfiei dessa expressão. “Amor livre”… parece pleonasmo. Se não for livre, vai ser o quê? Amor preso? Amor limitado, amor escravo…? Decerto vai… e decerto é por isso que as pessoas tem tanto medo do tal “amor livre”, acostumadas que estão a serem limitadas, presas, escravas…
Amor e liberdade são palavras grandes, que assustam… os dois vem sem manual de instrução, sem rede de segurança. Pra amar e pra ser livre é preciso confiança, justamente algo que foi muito machucado na vida de todo mundo que foi criança um dia. A gente cresce com a noção (duramente aprendida) de que amar é perigoso, e que liberdade é um estado a ser alcançado quando eu tiver dinheiro suficiente, segurança suficiente, status suficiente…
Amor livre é um caminho de crescimento. A gente se apaixona, se envolve e começa um relacionamento. O início é vivo, cheio de tesão, de sentimento, frio na barriga… a gente fica mais bonito, mais amoroso, cheio de energia. E aí surge a grande idéia de garantir que isso não acabe nunca! Até contrato assinado a gente faz pra registrar essa garantia! Mas não é assim que funciona, amigos! A gente sentiu esse amor num momento em que se sentia livre, disponível, aberto pra isso. Essa é a dica! Vale muito mais investir nessa liberdade, disponibilidade e abertura, pois assim é que as coisas acontecem! Assim é que o amor acontece. A partir do momento em que você decide trancar num cofre teu tesão, teu amor, teu carinho, pra só tirar na hora certa, com a pessoa certa… estamos decretando a falência do amor.

O fantasma da traição
Responde rápido: do que você tem mais medo – de sentir atração por outra pessoa ou de que seu parceiro, sua parceira sinta atração por outra pessoa? Já parou pra pensar? O mais normal é que a pessoa tenha medo de que o outro fique a fim de alguém. E aí? O que pode acontecer de tão terrível?
Cenário 1 = ele ou ela se apaixonam pela outra pessoa e você baila. Você acha mesmo que se ele ou ela reprimirem o que sentem por essa outra pessoa vocês vão ficar melhor? Preferiria que ele/ela ficasse com você, mesmo sendo a fim de outro/a? (se a resposta for sim, não precisa continuar lendo esse texto)
Cenário 2 = ele ou ela sentem atração por outra pessoa, “conferem a situação” (se permitem ficar com essa pessoa e ver o que rola) e vêem que não era nada importante, e voltam pra você ainda mais confiante no amor de vocês. Legal, né?
Cenário 3 = ele/ela sentem atração, conferem a situação e vêem que não era nada demais, mas que na verdade sentiram atração por outra pessoa porque não está mais rolando entre vocês. Assim uma situação que pode ter estado estagnada entre vocês se resolve e fica tudo mais claro. Melhor do que ficar na estagnação, né?
Cenário 4 = ele/ela sentem atração por várias pessoas, o tempo todo e “tem que conferir” o tempo todo, ou seja, transar com todo mundo… bem, talvez esta pessoa não esteja a fim de estar num relacionamento… E aí, você vai querer estar num relacionamento com esta pessoa? Agora inverte estes cenários e considera que você é a pessoa que sentiu atração por outro/a. Como se dão estas equações?

Ciúme nunca foi medida de amor, só em música de dor de cotovelo… Ciúme é um sintoma da falta de amor que nós vivemos ao crescermos, da falta de confiança no amor, da falta de confiança em nós mesmos. E querer limitar o parceiro para sentirmos menos ciúmes só garante uma coisa: que o ciúme vai continuar intacto e a falta de confiança também. A gente pode brincar de pertencer um ao outro, como falam tantas músicas de “amor”, mas à medida que a gente amadurece, chega hora que a brincadeira vence a validade e a gente tem que partir pra vôos mais altos. Mas, veja bem, envelhecer é certo pra todo mundo, já amadurecer é escolha pessoal…
E a piada escondida nisso tudo, todo esse pandemônio de pavor do amor livre e de ser deixado, rejeitado, abandonado, é que, à medida que você permanece honesto e autêntico com o que sente, sem se esquivar dos desafios que o amor vai inevitavelmente trazer, toda essa necessidade de experiência vai relaxando e caindo literalmente “de madura”. O amor sobrevive a desafios, e cresce com eles, assim como tudo que é vivo. As próprias plantas para crescerem fortes, precisam de ventos, chuvas, sol, não só de tempo bom…

“Felizes para sempre”
Era uma frase bonitinha quando a gente tinha 5 anos e ouvia as histórias na hora de dormir. Mas eu desconfio da felicidade contínua da Cinderela e seu príncipe, da Branca de Neve e seu príncipe, Rapunzel, Bela adormecida, etc, etc…
A gente precisa entender o sentido de “endless love” (amor sem fim). O amor da gente não acaba, mesmo, mas vai mudando de direção. Não dá pra forçar. Não tem que durar pra sempre com aquela pessoa. Importa é o amor que você viveu, não o tempo que ele durou. Cada encontro é uma possibilidade de amor. Amores de uma noite, semanas, anos, qual não vale a pena? E “se não há amor, não te demores”.
Tá mais que na hora da gente sair desse clichê que “amor livre” significa transar com outras pessoas. Tá na hora de respeitar o amor mais do que os nossos medos, de reconhecer que o amor vem pra esculhambar nossos limites e nos fazer expandir, a ponto de nos querermos livres, e a quem amamos também. E aí esse amor pode expandir pra fora do relacionamento, pra amizades, causas, nossa comunidade, nosso planeta. Estamos perdendo muito do que o amor tem pra nos mostrar enquanto insistimos na birra do “é só meu!”

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